Falei um pouco com a repórti hoje. Ela já estava lá, cedinho cedinho, escolhendo o melhor ângulo, analisando a luz, checando altura do muro ... do muro do cemitério.
Ela que é tão jovem que nem sabe direito a diferença entre mausoléu e gaveta, já aprendendo a não sentir. Já tendo que aprender a não sentir.
E vão ser longas estas horas pra quem trabalha. Repórter, fotógrafo, motorista, garçom, bombeiro, faxineira, câmera, técnico, eletricista, motoqueiro, porteiro, padre, polícia militar, polícia civil, coveiro ... a mulher que toma conta do banheiro do Palácio da Aclamação. Cada um deles é uma pauta. Uma história. Uma vida.
A repórter nunca viu nada igual. E não verá. Dona Arlete só existe uma. Tentei explicar o inexplicável. Como é, quem é Dona Arlete. A viuva dele. A mãe que perdeu a filha suicida com um tiro na cabeça aos trinta e poucos anos, no quarto, em casa. A mãe que perdeu o filho rebelde vitima de um ataque cardíaco como gota d'água de tantas coisasa aos quarenta e poucos anos. A mãe que não pode ficar tão próxima da outra filha. A mãe de um Junior que lhe deu um Neto, e de um Luiz que lhe deixou um Filho que passa longe do filho que ele foi.
Dona Arlete está como sempre está. Sem um traço de expressão no rosto. Dentro do carro, na Base Aérea de Salvador, ela nem levanta o vidro elétrico. Não usa óculos escuros. Não chora. Não olha para as lentes. É dona Arlete. A de sempre.Não! Não é mais a de sempre! Agora é Dona Arlete. A viúva.
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.Nos jovens herdeiros se vê a tristeza da falta do líder. Duquinho é Duquinho. Não exatamente o que o velho ACM gostaria que ele fosse. E ACM Neto não se parece com o avô. Nem se parece com o tio. Gosto desse menino que se fez sozinho. Quase escondido. Quando o avô notou, e não gostou, Neto já era "a promessa". Ainda era Toni quando encantou Fernando Henrique Cardoso, mas mesmo sendo o que é hoje, não chegou sequer a balançar o encanto do avô pelo tio Luiz Eduardo. Talvez se tivesse mais tempo ... Eu gosto do menino Neto.
Mas ó paí ó ... depois diz que a gente é preconceituoso ...
O povo tá enfiando telefone celular na cara do morto ...
Tá vendo aí ... tá vendo aí ...
Isso não existe!!!
E você aí, que tá fazendo reportagem, já sabe quem são esses jovens de uma tropa de elite em cima do carro do corpo de bombeiros guardando o caixão, né?
Vai me contar de onde eles vieram, quantos anos eles têm, se votaram em ACM, se têm filhos, quanto ganham ... Afinal, são quilômetros e quilômetros tomando conta do morto baiano mais famoso desde ... desde ... desde Jorge Amado né não?
Quem são os mocinhos ?
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Ah! As fotos? São da trasnmissão da TV Salvador.
Eu tirei da TV daqui mesmo, sentadinha na frente do computador tomando um balde de sorvete de flocos.
Ou por um segundo você achou que eu estava lá...?
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3 Comentários:
Minha querida gordalouca,
Uma das imagens que tenho gravada, creio que para sempre, na minha mente, é a máscara de dor da Sra. Arlete Magalhães, no enterro de Luís Eduardo.
Algo tão privativo, tão particular.
O show era dele, do marido. Mas a dor, aquela profunda, aquela que estraçalha, era só dela.
Fiquei a imaginar as tantas dores dessa mulher.
Seria uma grande biografia. Talvez a mais interessante de todo o clã. Imagine o quanto este silêncio doloroso, que é quase um grito,deve ter pra dizer.
É verdade Ari, quantos segredos d. Arlete deve ter sepultado em sua alma de esposa, mãe, avó.....quantas dores caladas, engolidas à força. Deve ser uma grande mulher.
Quanto a tu Carminha, eu tinha certeza que estavas lá. Absoluta.
Vocês já pensaram o que é ter sido mulher daquele cara?
Também, foi porque quis. Mas que sempre pareceu carregar com resignação uma cruz tenebrosa, isso pareceu, sim.
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