TERCEIRO DIA

Quando a gente se muda percebe claramente o que significa dizer que baiano vive em outro ritmo. Como se sabe desde Cabral, existem três ritmos: lento, muito lento e Dorival Caymmi.Em períodos de mudança tudo fica Dorival Caymmi.

Cinco dias depois da solicitação de transferência de endereço, aquela simpática mocinha robótica do telemarketing da NET informa que o sistema não tem registro do seu pedido mas ... em 72 horas no máximo, uma ligação me informará se eles encontraram ou não a gravação que prova que eu de fato telefonei e que eu de fato mudei. Se isso não ocorrer eu volto a ligar. Se ocorrer eu aguardo o que eles vão me dizer. Gritos e sussuros depois ligo novamente e solicito pra outro atendente a tal mudança de endereço. Novidade: o rapaz diz que demora no máximo 24 horas. Mas tudo tem preço: 122 reais. OK. 34 minutos depois, na hora do vamo vê ... a ligação cai. Outra tentativa e ... numa coincidência mítica nunca vista, é a mesma simpática mocinha robótica atendente da primeira vez. A Viviane! Tadinha ... Juro que fiquei com dó da criatura ... A essa altura ela tinha na tela o meu endereço novo completinho e me garantiu que em – no máximo – 24 horas, eu teria o sinal da TV e da Net em casa. Perfeito!

Menos Maria José ... menos ...

Primeiro “o rapaz” vai no endereço antigo [que é duas quadras daqui] desligar. E antes me liga avisando. Tava bom demais. Querida Viviane – eu digo docemente - nunca jamais em tempo algum eu recebi um só telefonema da NET ! E pela enésima vez a gentil simpática mocinha robótica telemarketeira garante que DESTA VEZ vai ligar. Tá.

A GRANERO [que embrulha até os pés do sofá] jura de pé junto que assume todo e qualquer dano provocado pela e na mudança. Sei. A mesa da sala está na porta do quarto de empregada desde sexta feira porque o tal marceneiro responsável pelo setor está não sei onde. O vidro da cristaleira que quebrou será trocado logo depois que o rapaz vier aqui medir. E as caixas, bom ... as caixas eu autorizei a Lola aqui da casa a vender pra meu amigo da Amaral Comércio de Papel Ltda. O gás será ligado assim que o serviçal do prédio tiver um tempo. A torneira do banheiro não fecha. O maleiro da suíte não abre. A morta que esperou o marido ir primeiro, deixou aqui um álbum de fotografias em cima de um cofre dentro de um dos quatro gigantescos armários.

Mas de tudo, o mais curioso [além daquelas 2 caras de leões prateadas com argolas na boca, colocadas sobre a pia para pendurar pano de prato] é uma coisa que tem no corredor. Um pequeno armário embutido. EMBUTIDO. Vertical. Metro e meio de altura dividido ao meio. Duas portas. Dentro, três prateleiras em cada compartimento. E uns cincoenta centímetros de profundidade. Não faço a mínima idéia da utilidade do bicho esquisito. Já pensei em tirar as portas e forrar todo de espelho. Mas não consegui fechar a idéia...

Pensei também em tirar as prateleiras e fazer um altar. Mas quem vai rezar num corredor entre a suíte e a sala?

Também já pensei em cimentar as portas e dar uma “demão” de tinta da cor do corredor. Branco. Pronto. Definitivo e esquecido.

Não sei ainda, mas já virou atração turística.

De qualquer forma ... a tecnologia é um luxo! Nada pode ser mais in do que estar recostada numa cama super king size com um notebook apoiado no colo plugado numa internet sem fio altíssima velocidade! Me sinto a própria Carrie com sotaque óxenti!

Merda! Aquela magricela nojenta me fez lembrar que amanhã tem vigilantes do peso! Adeus!

PS: o bichano branco hoje se arvorou até o quarto de empregada. Não me disse nada quando voltou.